Sala
70 é um beatmaker cozinheiro, e de temp(er)os para cá nos mostra constante
evolução e competência na programação de seus instrumentais. A evolução do “chef” em
temperar instrumentais através de suas mixagens e equalizações é evidente para
quem o acompanha desde a época do auge do MySpace. Hoje com seu trabalho
divulgado principalmente pelo Soundcloud, ele pode mostrar todo o peso e a
definição de graves e agudos de sua ótima fase.
- Por que
esse nome, Sala 70?
Nem todos sabem o quanto é difícil bolar um nome artístico, um
nick, um vulgo, um "aka". Comecei a pensar tecnicamente, queria um
nome pronunciável na maioria dos idiomas, simples e diferente dos
convencionais. Certo dia, sintonizei na TV Cultura e comecei a assistir a uma
orquestra na Sala São Paulo. Além de me encantar com a beleza da sala, fiz a
analogia de que o maestro coordenava vários músicos naquela "sala" e
eu, aqui no meu quarto, coordenava alguns instrumentos e samples – que, na
grande maioria das vezes, são da década de 1970. Daí foi só ligar os pontos e
formar: Sala 70
- Hoje em dia, o acesso a um computador e a softwares é fácil, e
muitos novos beatmakers têm surgido graças a essa facilidade. Que consequências
você vê nisso?
A consequência clara é a produção de beats em massa. Isso é muito
bom, muitíssimos talentos e novos estilos puderam surgir, é liberdade musical!
Mesmo que de cada 1.000 usuários de Fruity Loops surja apenas um bom beatmaker,
já é válido. Só peço atenção para quem está começando hoje e já está se
intitulando como “produtor”: ter uma ou duas poesias escritas no seu caderninho
não faz de você um poeta. Do mesmo jeito que sentar no computador e fazer uma
ou outra batida não faz ninguém ser um beatmaker, muito menos um produtor.
- O que você acha das fontes de
sample? Faz diferença, de alguma forma, extrair o áudio de um vinil, por
exemplo? Existe um valor cultural histórico nisso?
Acho que é uma questão cultural e de grandíssimo valor. O MP3 e a
internet são muito mais novos que o rap. Os beats sampleados sempre foram
feitos em cima de discos de vinil, a história foi feita assim. Há quem prefira
destrinchar sebos atrás de raridades, colocar o vinil para rodar e recortar, e
há quem goste da comodidade de usar o YouTube ou o Google como fonte de
pesquisa, e ripar um som em MP3. Hoje em dia temos essa opção. Não sou contra
quem sampleia MP3, acho que o produto final poderá agradar ou não o ouvinte,
independente de onde veio o sample, se de um disco de vinil ou de um MP3. Mas
uma coisa é fato: um vinil em bom estado sempre terá o som real e o MP3 sempre
vai ter seu som comprimido.
- Que
beatmaker você acha inovador na arte de cortar samples? E o que acha dos
samples em bloco, aqueles que usam um grande trecho da música original quase
sem alterações?
Até hoje não vi ninguém superar a técnica de cortar samples do DJ
Premier e do “todo poderoso” J. Dilla. Esses dois são meus grandes ídolos na
produção de rap e referência. Aprecio também os samples corridos, “loopões”
quase inalterados. Madlib (outro ídolo) é mestre em achar esses loops
perfeitos.
- Quem
conhece acompanha seu trabalho pela internet há algum tempo percebeu uma
considerável mudança na qualidade dos últimos instrumentais, desde a
criatividade até a equalização e mixagem. Isso se deve só ao uso do Soundcloud?
(Risos) Também ajudou, quem teve ou ainda tem MySpace sabe como é
a qualidade de som por lá. Comecei a produzir usando caixas CCE de madeira
muito antigas e ruins, e um fone de ouvido de camelô, daqueles de R$ 5. Depois
dessa fase, o upgrade foi um rádio LG com caixas até que honestas. Na
sequência, comprei um bom par de fones de ouvido, que já me deu uma outra noção
de mixar. A última aquisição foi um par de caixas monitoras. Quanto ao processo
criativo, ele vai amadurecendo com o tempo. Passei a ser menos intuitivo e mais
preciso nas sonoridades que procuro.
- Qual é a
influência afrobrasileira religiosa no seu trabalho?
Na verdade, a parte afrobrasileira religiosa não me influencia,
não. Andei sampleando algumas coisas da umbanda apenas. Respeito a religiosidade
e a religião de todos.
- Na
produção de rap, que beatmakers brasileiros você acha que se destacam hoje?
Tem muita gente fazendo boas batidas e evoluindo. Os participantes
da Liga dos Beats (32 beatmakers) e os que participaram ao longo desses últimos
anos das Battle Beats são, em sua grande maioria, excelentes beatmakers, e
exemplo para quem está começando agora. Vou citar aqui alguns poucos nomes dos
caras que vejo estar se destacando, mas sem desmerecer ninguém: Nave, Renan
Samam, Henrique Jonas, DJ Caíque e Stereodubs. Além de estarem se destacando,
são grandes talentos e muito bons no que fazem.
- Alguns
músicos questionam a legitimidade do sample como composição. Sample é uma
composição? É uma criação musical?
O Sample na mão de um músico/beatmaker é um componente. Com aquele
componente, junto de outros, ele vai criar a sua obra. Sample, traduzindo para
o português, quer dizer "amostra". Então, uma amostra não pode ser
chamada de resultado final.
- Como de
praxe, pra finalizar, um espaço livre pra você se expressar.
Primeiramente, obrigado pelo convite. É sempre importante dividir
opiniões e ideias, ajuda muito no crescimento e na evolução de todos nós.
Gostaria de utilizar esse espaço para deixar um recado aos MCs: vamos pegar o
bom costume de, sempre que abordar ou procurar um beatmaker, valorizá-lo,
perguntar quanto custa o seu trabalho. Todos nós do rap queremos ser
profissionais, fazer videoclipes, EPs, camisetas, adesivos... não é verdade?
Então está na hora de agir também como profissionais e tratar os beatmakers
como produtores de ritmo, e não como “fazedores de favor”. Nós somos o
"R" do rap não se esqueçam. Não fazemos turnê subindo nos palcos e
recebendo cachê, nossos beats é que sobem e acompanham vocês. Então é mais do
que justo pagar por eles. Pensem nisso!
Contatos:
Twitter:
@Sala70
Email:
sala70beats@hotmail.com
Batidas:
http://soundcloud.com/sala-70
Thiago, adorei o site e achei ótimas as entrevista. gostaria de saber como faço para te enviar uma sugestão de pauta, tem algum e-mail onde possamos conversar?
ResponderExcluiratt
fabiola
Tem sim Fabiola, anote aí: hiagogreps@hotmail.com
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