sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Entrevista com Luiz Café



Luiz Café é produtor e tem uma história de amizade muito interessante com Mc Marechal, principal responsável pela ida do produtor de Porto Alegre até o Rio de Janeiro, onde hoje vive. A partir daí deu um grande salto em sua atividade musical, e se fazendo conhecido primeiramente pelo single “Sangue bom” em parceria com Mc Marechal.

Obrigado Luiz Café.


- Sabemos que você é um produtor que pouco usa o recurso do sample. Por que?

Salve, irmão! Muito obrigado pelo respeito e por esta oportunidade! Então... Acredito que o motivo de eu não usar muito sample vem da forma de trabalhar, pois meu processo de criação muitas vezes vem primeiro de alguma melodia de voz. Às vezes, quando dou início com algum tipo de sample, e quando começo a colocar os instrumentos, chega uma hora em que eu retiro o sample e deixo só o que foi criado por cima dando assim espaço para outras ideias, inclusive de refrões e rimas para a música que está sendo criada.

- Hoje em dia, o acesso a um computador e a softwares é fácil, e muitos novos beatmakers têm surgido graças a essa facilidade. Que consequências você vê nisso?

Eu acredito que tudo em que a gente se interessa ou acredita precisa ser levado a sério, então precisamos estudar muito e saber exatamente o que estamos fazendo! Não adianta ter o melhor estúdio do mundo se você não souber a diferença de um compressor para um limiter, por exemplo. E é essa a consequência que vejo nisso! Alguns acham que um computador no quarto basta!

- O que você acha das fontes de sample? Faz diferença, de alguma forma, extrair o áudio de um vinil, por exemplo? Existe um valor cultural histórico nisso?

Eu acho muito louco escutar uma música sampleada com estilo e criatividade! Quanto a extrair um sample direto do vinil, depende do que você quer fazer. A textura da música muda, com certeza! Eu conheço pessoas que valorizam muito músicas feitas com samples antigos.

- Você usa softwares ou bateria eletrônica como a MPC? Sabe nos dizer as diferenças entre esses dois modos de compor?

Eu uso Softwares e MPC. Para mim, a MPC acaba sendo bastante limitada! Então, eu uso a MPC para criar uma bateria e ter um pouco mais de dinâmica, e para cortar samples. Depois disso, jogo tudo no Pro Tools, onde eu gravo mais instrumentos, tendo como abrir plugins de efeitos, filtros, e gravar uma guia de voz, podendo abrir alguns timbres do Reason e, se precisar colocar alguma coisa no tom, eu ligo o Melodyne, tudo junto. Quando eu crio algo só na MPC é mais para me divertir.

- Que beatmaker você acha inovador na arte de cortar samples? E o que acha dos samples em bloco, aqueles que usam um grande trecho da música original quase sem alterações?

Inovador não sei lhe dizer! Mas musicalmente acho o Kanye West muito bom com samples! Tudo depende da música para mim. Se o cara pegar um sample, não mudar nada e fizer uma música boa, vou achar muito bom! Agora, se o cara picotear todo o sample, mudar aqui e ali, e a música não for boa no todo, vou achar ruim.

- Na produção de rap, que beatmakers brasileiros se destacam hoje?

Gosto do Riztocrat, Damien Seth, Marechal, Dario, Nave, Laudz, Casp e Daniel Ganjaman.

- Alguns músicos questionam a legitimidade do sample como composição. Sample é uma composição? É uma criação musical?

Se você pegar aquele sample e colocar um outro baixo e outra bateria, estará colocando a sua visão naquelas melodias que já foram criadas pelo dono da canção, ou seja, a composição não será sua! Apenas a criação em cima das melodias de outros músicos.

- Para onde caminha o futuro das produções de rap na sua opinião? Nos samples e instrumentos digitais? Ou os instrumentos acústicos e elétricos vão voltar?

Acredito que, no futuro, a mistura de instrumentos digitais e orgânicos vão ser inevitáveis para um bom produtor. Eu Já faço isso e conheço alguns produtores que fazem isso também.

- Como de costume, pra finalizar, um espaço livre pra você se expressar.

Muito obrigado pelo espaço!

Twitter – @luiz_cafe


Tel: 21 – 8141 5738

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Entrevista com Sala 70

Sala 70 é um beatmaker cozinheiro, e de temp(er)os para cá nos mostra constante evolução e competência na programação de seus instrumentais. A evolução do “chef” em temperar instrumentais através de suas mixagens e equalizações é evidente para quem o acompanha desde a época do auge do MySpace. Hoje com seu trabalho divulgado principalmente pelo Soundcloud, ele pode mostrar todo o peso e a definição de graves e agudos de sua ótima fase.


- Por que esse nome, Sala 70?

Nem todos sabem o quanto é difícil bolar um nome artístico, um nick, um vulgo, um "aka". Comecei a pensar tecnicamente, queria um nome pronunciável na maioria dos idiomas, simples e diferente dos convencionais. Certo dia, sintonizei na TV Cultura e comecei a assistir a uma orquestra na Sala São Paulo. Além de me encantar com a beleza da sala, fiz a analogia de que o maestro coordenava vários músicos naquela "sala" e eu, aqui no meu quarto, coordenava alguns instrumentos e samples – que, na grande maioria das vezes, são da década de 1970. Daí foi só ligar os pontos e formar: Sala 70

- Hoje em dia, o acesso a um computador e a softwares é fácil, e muitos novos beatmakers têm surgido graças a essa facilidade. Que consequências você vê nisso?

A consequência clara é a produção de beats em massa. Isso é muito bom, muitíssimos talentos e novos estilos puderam surgir, é liberdade musical! Mesmo que de cada 1.000 usuários de Fruity Loops surja apenas um bom beatmaker, já é válido. Só peço atenção para quem está começando hoje e já está se intitulando como “produtor”: ter uma ou duas poesias escritas no seu caderninho não faz de você um poeta. Do mesmo jeito que sentar no computador e fazer uma ou outra batida não faz ninguém ser um beatmaker, muito menos um produtor.


- O que você acha das fontes de sample? Faz diferença, de alguma forma, extrair o áudio de um vinil, por exemplo? Existe um valor cultural histórico nisso?

Acho que é uma questão cultural e de grandíssimo valor. O MP3 e a internet são muito mais novos que o rap. Os beats sampleados sempre foram feitos em cima de discos de vinil, a história foi feita assim. Há quem prefira destrinchar sebos atrás de raridades, colocar o vinil para rodar e recortar, e há quem goste da comodidade de usar o YouTube ou o Google como fonte de pesquisa, e ripar um som em MP3. Hoje em dia temos essa opção. Não sou contra quem sampleia MP3, acho que o produto final poderá agradar ou não o ouvinte, independente de onde veio o sample, se de um disco de vinil ou de um MP3. Mas uma coisa é fato: um vinil em bom estado sempre terá o som real e o MP3 sempre vai ter seu som comprimido.

- Que beatmaker você acha inovador na arte de cortar samples? E o que acha dos samples em bloco, aqueles que usam um grande trecho da música original quase sem alterações?

Até hoje não vi ninguém superar a técnica de cortar samples do DJ Premier e do “todo poderoso” J. Dilla. Esses dois são meus grandes ídolos na produção de rap e referência. Aprecio também os samples corridos, “loopões” quase inalterados. Madlib (outro ídolo) é mestre em achar esses loops perfeitos.


- Quem conhece acompanha seu trabalho pela internet há algum tempo percebeu uma considerável mudança na qualidade dos últimos instrumentais, desde a criatividade até a equalização e mixagem. Isso se deve só ao uso do Soundcloud?

(Risos) Também ajudou, quem teve ou ainda tem MySpace sabe como é a qualidade de som por lá. Comecei a produzir usando caixas CCE de madeira muito antigas e ruins, e um fone de ouvido de camelô, daqueles de R$ 5. Depois dessa fase, o upgrade foi um rádio LG com caixas até que honestas. Na sequência, comprei um bom par de fones de ouvido, que já me deu uma outra noção de mixar. A última aquisição foi um par de caixas monitoras. Quanto ao processo criativo, ele vai amadurecendo com o tempo. Passei a ser menos intuitivo e mais preciso nas sonoridades que procuro.

- Qual é a influência afrobrasileira religiosa no seu trabalho?

Na verdade, a parte afrobrasileira religiosa não me influencia, não. Andei sampleando algumas coisas da umbanda apenas. Respeito a religiosidade e a religião de todos.


- Na produção de rap, que beatmakers brasileiros você acha que se destacam hoje?

Tem muita gente fazendo boas batidas e evoluindo. Os participantes da Liga dos Beats (32 beatmakers) e os que participaram ao longo desses últimos anos das Battle Beats são, em sua grande maioria, excelentes beatmakers, e exemplo para quem está começando agora. Vou citar aqui alguns poucos nomes dos caras que vejo estar se destacando, mas sem desmerecer ninguém: Nave, Renan Samam, Henrique Jonas, DJ Caíque e Stereodubs. Além de estarem se destacando, são grandes talentos e muito bons no que fazem.


- Alguns músicos questionam a legitimidade do sample como composição. Sample é uma composição? É uma criação musical?

O Sample na mão de um músico/beatmaker é um componente. Com aquele componente, junto de outros, ele vai criar a sua obra. Sample, traduzindo para o português, quer dizer "amostra". Então, uma amostra não pode ser chamada de resultado final.

- Como de praxe, pra finalizar, um espaço livre pra você se expressar.

Primeiramente, obrigado pelo convite. É sempre importante dividir opiniões e ideias, ajuda muito no crescimento e na evolução de todos nós. Gostaria de utilizar esse espaço para deixar um recado aos MCs: vamos pegar o bom costume de, sempre que abordar ou procurar um beatmaker, valorizá-lo, perguntar quanto custa o seu trabalho. Todos nós do rap queremos ser profissionais, fazer videoclipes, EPs, camisetas, adesivos... não é verdade? Então está na hora de agir também como profissionais e tratar os beatmakers como produtores de ritmo, e não como “fazedores de favor”. Nós somos o "R" do rap não se esqueçam. Não fazemos turnê subindo nos palcos e recebendo cachê, nossos beats é que sobem e acompanham vocês. Então é mais do que justo pagar por eles. Pensem nisso!

Contatos:

Twitter: @Sala70

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Entrevista com Dj Nuts



Nuts, muito obrigado por aceitar responder as questões da nossa entrevista. É de imenso prazer poder trocar palavras com um dos maiores mestres do vinil no Brasil, um exímio pesquisador de música brasileira, e que nos presenteia vez em quando com a amostra de pedras raras da nossa cultura musical envolvidas com a técnica apurada das suas mixagens. O rei das embaixadinhas nos toca-discos. Obrigado.


- Você produziu faixas de um dos mais clássicos discos de rap nacional, o Eu tiro é onda primeiro álbum solo do Marcelo D2, já usando a mistura de samba com rap através de samples. Naquela época já existia alguma referência para fazer essa mistura? 
Não foi primeira vez que samplearam "Brasil". Ao mesmo tempo, eu não tinha referência de identidade ao começar o disco. Tinha algumas batidas nessa ideia e o Marcelo tinha ouvido e resolveu usar. Marcou para mim, foi além de batidas adicionar o trabalho de músicos como João Donato e Dom um Romão. Também o standart de gravação e acabamento que o rap nacional até então não tinha visto. Um disco que possibilitou minhas primeiras experiências na Akai MPC. Fiz o disco quase todo em um fim de semana, aprendendo a mexer nesse equipamento.

- Hoje em dia, o acesso a um computador e a softwares é fácil, e muitos novos beatmakers têm surgido graças a essa facilidade. Que consequências você vê nisso?
Mais gente fazendo, não vejo mal nisso, é fundamental até mesmo para que as pessoas vejam a diferença entre todos. O que eu gosto é ver gente com menos recursos fazendo batidas mais legais do que os que têm estúdio e toda estrutura, até mesmo porque quando comecei era essa a onda. Hoje em dia muita gente vem me falar sobre novas tecnologias e tal, e continuo trabalhando com emulator SP 1200, e na estrada usando MPC 500, pois funciona a pilha e é muito legal fazer em qualquer lugar, no avião, ou no quarto de hotel, sampleio do iPod, pois nesse tenho discos que digitalizei e kits de bateria para viagem.

- O que você acha das fontes de sample? Faz diferença, de alguma forma, extrair o áudio de um vinil, por exemplo? Existe um valor cultural histórico nisso?
Não no resultado, e sim pessoalmente para cada um. Eu sou colecionador, coleto minhas próprias amostras e cuido de limpar todos os meus kits de bateria por questão de ética pessoal. Para mim, não tem como fazer uma batida usando a batida de alguém.

- Um dos seus mix CDs tem o título de Cultura Cópia. Por que esse título?

É uma referência à influência norte-americana na música brasileira da época.

- Que beatmaker você acha inovador na arte de cortar samples? E o que acha dos samples em bloco, aqueles que usam um grande trecho da música original quase sem alterações?
A originalidade pode morar em tudo isso. Veja que às vezes posso achar um trecho sendo longo tendo certeza que ninguém vai saber de onde é que saiu. Na minha visão, fazer batidas tem a ver com achados em garimpo, assim como os produtores que são minha influência, todos esses fizeram as pessoas procurarem os discos que por eles foram usados. Esse é o barato para mim. Tenho acervo grande, pois comecei faz tempo. Hoje em dia é dificil começar a colecionar, essa nova geração se desinteressou em discos devido ao difícil acesso e ao preço elevado nos dias de hoje. Então, optaram por outro caminho de softwares e controladores, e ficar vendo quem sampleou quem na internet e tal, que é normal também. Dou muito mais valor para o pessoal que frequenta sebos atrás de amostras de som que não estão em discos caros exatamente.

- Na produção de rap, que beatmakers brasileiros se destacam hoje?

Não vou destacar ninguém para despertar aqueles que são bons para o seu potencial, estão se dedicando para fazer algo tão bom quanto alguma coisa que deu certo na “Norte América”. Para mim, cada um poderia pegar essa energia toda e canalizar para fazer algo original. Eu não tô fora dessa cobrança, é minha missão também e de alguns por aqui. O brasileiro se mostra complexado em querer provar que pode chegar no mesmo resultado que os gringos. Isso vem desde sempre na nossa cultura, pegar o que vem de fora - não tirando o mérito de ninguém, pois muitas vezes essas tracks chegam em bom resultado nas pistas e a festa agradece.

- Você acha que uma versão sampleada pode chegar ao nível de sua original?

Às vezes, mais interresantes para os jovens, assim como
Jay electronica Exibit C é um dos chops mais legais da atualidade em cima do "Cross my heart".

- Alguns músicos questionam a legitimidade do sample como composição. Sample é uma composição? É uma criação musical?

É composição de qualquer jeito, justificada na criação. Se existe, é porque foi composta, não importa se lhe agrada ou não. O músico se sente machucado quando “roubam” a obra toda, até entendo. A única regra é quando o disco tem uma perspectiva comercial, é certo pedir autorização ao dono e negociar a porcentagem pelo uso. O problema é que, nos dias de hoje, caíram muito todos esses números, devido à baixa da indústria musical. Ouvi dizer de autores processando por samples e gastando mais com advogados, pois o dinheiro não está mais lá.

- O sample é também uma espécie de resgate de músicas de décadas atrás que foram esquecidas? Os artistas antigos entendem assim também?

Alguns desses artistas estão em clima de resgate e ficaram felizes com isso. Destaque mais para a Cláudia, sampleada pelo Nave no track "Desabafo" (Marcelo D2), foi grande coisa, gostei. Fora isso, Jay-Z usando Marcos Valle e negociando porcentagens. Arthur Verocai me perguntando se eu conheço um rapper chamado Ludacris... e disse "Ele me sampleou". Expliquei que há uma boa diferença entre um artista independente como MF Doom o samplear e um rapper comercial como o Ludacris.

- Você é DJ e beatmaker, certo? Você pretende atuar musicalmente em mais alguma área fora as duas?

Colecionismo. Desperta todo o meu interesse. Dedico meu tempo para isso.

Se quiser saber mais do Dj nuts, seu trabalho e baixar seus mix cd's, acesse seu blog:

Sample+Logia

Sejam todos realmente bem-vindos, produtores, beatmakers, dj's e apreciadores do sample. O Blog Sampleologia surgiu de uma sede de mais informações sobre o assunto, e como "logia" significa Estudo, surgiu o nome. Opinião de gente que vive à base de música, que lida com música e a fórmula de produção do Sample. Por isso vamos tratar de assuntos mais técnicos, como também de assuntos simples, com entrevistas com gente ativa nesse meio, na intenção de desmistificar essa arte, que muito se ouve finalizada mas pouco se comenta sobre seu processo de criação. Comentários serão importantes pra que possamos discutir e evoluir nosso entendimento sobre o assunto. Fiquem à vontade.