Rodrigo Brandão é uma outra figura
ativa e muito importante no Hip-hop Nacional que passa aqui pelo Sampleologia.
Fora seu trabalho musical carregado de brasilidade em parceria com Lurdez da Luz no Mamelo Sound System, sabemos da sua atuação
promovendo eventos de muita qualidade e acessibilidade pra quem admira a
Cultura Hip-hop. Obrigado.
- Rodrigo, quem cria os
instrumentais do Mamelo? Você também cria os Boom-baps?
No nosso último álbum,
“Velha-Guarda 22”, quem maestrou a coisa toda foi o Scotty Hard, um daqueles
super-heróis subliminares que só quem é conhece. Ele já trabalhou em discos
fundamentais como “De La Soul Is Dead”, “Wu-Tang Forever” e “Sex & Violence”
do Boogie Down Productions, além de assinar a produção de alguns dos melhores
trampos do Medeski Martin & Wood. Mas o Mamelo também já rimou em beats de
muitos outros artistas, tanto gringos (High Priest, Wax Poetic, Spectre,
Metastaz) quanto nacionais (Parteum, Maquinado, Yoka, Kiko Dinucci). Eu não
meto a mão nos botões, mas sempre tenho presença ativa na produção: seleciono
samples, faço a parte de conceituar o trampo, escolher as participações,
definir a cara e o caminho a ser seguido.
- Hoje em dia, o acesso a um
computador e a softwares é fácil, e muitos novos beatmakers têm surgido graças
a essa facilidade. Que consequências você vê nisso?
É uma faca de dois
“legumes”... O lado bom é a democratização, a fita de conseguir ferramentas
para se expressar, mesmo sem ter capital para investir nisso a princípio. O
problema é que, para cada Pizzol ou Tiago Rump (figuras que respeito, surgidos
nesse contexto), aparecem trocentos que só chegam atrás de dinheiro e fama,
maluco que antes não se lançava porque era uma busca, um processo evolutivo,
coisa que demanda tempo, dedicação e energia. Agora é só dar meia dúzia de
cliques no mouse, e o público acaba abraçando porque, para uma porção
significativa da sociedade, música é só mais uma pasta de arquivos no
computador ou no celular. Aí, o personagem e o figurino acabam, em geral,
valendo mais do que o som em si nessa Era Da Pós-Esperança, como diz o Black
Tought do The Roots.
- O que você acha das fontes
de sample? Faz diferença de alguma forma extrair o áudio de um vinil, por
exemplo? Existe um valor cultural histórico nisso?

- No extinto programa
“Vitrola Invisível” (UOL), rolava a sessão “Originais e Sampleadas”. Não existe
previsão da volta do programa ou do surgimento de algum programa semelhante?
Eu me divirto fazendo rádio,
e também tem a sensação gratificante de propagar música boa para quem se
interessa e muitas vezes não conhece determinado som ou artista. O lance de
“Originais e Sampleadas”, em especial, me fazia a cabeça, porque eu sou
hip-hop, mas amo, vivo e respiro música de uma penca de estilos, épocas e
lugares. Aliás, acho bem estranho quem é do rap e não tem um perfil assim,
porque é gritante que isso se faz necessário para a evolução quando você é
músico de qualquer estilo, e ainda mais num gênero que sempre viveu de buscar
elementos de outros ritmos e recontextualizar isso, que é o caso do hip-hop.
Mas, respondendo à pergunta, no momento nem faço ideia se algum dia vou voltar
a exercer tal função, seja num retorno do “Vitrola” ou qualquer outro esquema.
- Que beatmaker você acha inovador
na arte de cortar samples? E o que acha dos samples em bloco, aqueles que usam
um grande trecho da música original quase sem alterações?

- Na produção de rap, que
beatmakers brasileiros se destacam hoje?
Daqui do Brasil, eu curto
pacaraio o jeito que o M. Takara corta e usa os samples, e também a rapa do Elo
Da Corrente. São estilos bem diferentes, mas tem em comum a onda de ser muito
brasileiro de um modo nada óbvio ou clichê. Fora eles e os já citados em
perguntas anteriores, valorizo a musicalidade do Stereodubs e do Sala 70
(parceiro do meu mano Espião). Em Curitiba também tem caras bons, como o Nave e
o Dario.
- Alguns músicos questionam a
legitimidade do sample como composição. Sample é uma composição? É uma criação
musical?
Quem fala isso, em
geral, é marujo recalcado, perdido no
tempo ou ambos! É claro que existem casos de picaretagem pura e simples, que
beiram o plágio, e caracterizam apropriação indevida, mas o fato de você ouvir
uma faixa, perceber que determinado trecho pode ser extraído e com ele gerar
outra paisagem sonora, tem valor com certeza. Sem falar no efeito colateral de
fazer um público novo conhecer a obra do artista sampleado. O Arthur Verocai é
um cabuloso que andava no ostracismo e foi resgatado graças a Little Brother,
Doom e o DJ Nuts. Por conta disso, fez um show bombado em L.A., tocando seu
disco solo de 1972, com big band e orquestra, que foi lançado em DVD no box
Timeless. Isso levou ao par de concertos no Sesc Pinheiros em abril, que por
sua vez, espero que inspirem outros projetos e trabalhos ligados a esse maestro
ímpar. Mas, de novo: tudo (re)começou por conta dos beatmakers que samplearam a
música dele.
- O futuro do hip-hop está
mais relacionado ao sample ou ao uso de instrumentos tradicionais - os chamados
“instrumentos tocados”?
Ao meu ver, o que liga é a
intersecção de ambas as linguagens. Casar máquinas e músicos não é uma missão
simples, mas quando funciona bate mais forte do que o formato tradicional de DJ
+ MC e do que o chamado “rap com banda”, sabe? Tenho buscado isso em minhas
sambadas e cantadas atualmente.
- Como de costume, pra
finalizar, um espaço livre pra você se expressar.
Agradeço a oportunidade,
desejo vida longa e prosperidade ao blog, e aproveito pra avisar que estamos
com um álbum pronto, que deve ser lançado ainda em 2011, focado nos meandros
menos explorados da fusão de hip-hop com jazz. Trata-se de um encontro inédito
e exclusivo, com pessoas de diferentes formações, gerações, e origens: os
microfones do Mamelo, mais o lendário percussionista Naná Vasconcelos, mais os
músicos M. Takara e Guilherme Granado (Hurtmold), mais o trompetista Rob
Mazurek (Chicago Undergound Duo), mais o MC/poeta/beatmaker Mike Ladd... Tudo
isso arranjado pelo Scotty Hard, que também acrescentou guitarras e teclados em
algumas faixas. É doidêra de primeira, e boto mó fé que vai chapar o côco
daqueles que curtem sons da alma. Muito amor a todos os leitores!
http://www.myspace.com/mamelosoundsystem
http://www.myspace.com/mamelosoundsystem
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